TUNDAVALA
Revista Angolana de Ciência
Nesta perspecva consideramos importante fazer
uma breve referência à caracterização da província
da Huíla e dos três municípios onde se desenvolverá
o nosso trabalho, os municípios do Lubango, Matala
e Humpata, sendo que nos úlmos a acvidade
principal é a agricultura e a pecuária diferindo no
po de culturas e no grau de mecanização dos meios
ulizados nestas acvidades.
A Província da Huíla situa-se no sudoeste de Angola,
abrangendo uma área de 78.879 km2. Está delimitada
a Oeste pela Província do Namibe, a norte pelas
Províncias de Benguela e Huambo, a leste pelas
Províncias do Bié e do Kuando-Kubango, e a sul
pela Província do Cunene. Actualmente a divisão
administrava da Província da Huíla é composta por
14 municípios, 45 comunas (GPH, 2009).
Segundo o GPH, (2009) esma-se que 74% da
população da Província da Huíla se concentra em 6
dos 14 municípios, destacando-se o Lubango, Matala
e Caluquembe. Face à situação de guerra vericou-se
forte êxodo da população dos municípios do norte da
província para os municípios do Lubango e Matala.
Considera-se população urbana a que reside na sede
da província em habitações denivas. Na sua grande
maioria são funcionários públicos, empregados do
comércio e serviços e empresários. O Lubango, sede
administrava da província alberga o Governo Provincial,
Delegações Provincial dos Ministérios, Direcções
Regionais de Organismos e Empresas Públicas e ainda as
principais infra-estruturas de apoio (escolas, instutos
médios, universidades, hospitais, armazenistas, etc.).
Concentra maioritariamente a classe média e alta
da Província. A cidade encontra-se no centro de um
conjunto de eixos de vias de comunicação que ainda
mantêm alguma acvidade e que imprime alguma
animação económica à mesma (GPH, 2009).
Os municípios da Matala e Humpata enquadram-se no
que o GPH, (2009) considera população rural urbana,
a qual reside nos centros rurais que correspondem às
sedes dos municípios e que têm como rendimento
acvidades de índole comercial, agrícola e serviços
(funcionários públicos). A fuga por parte das
populações rurais por causa da guerra aumentou
a pressão demográca nas sedes municipais sob
administração do governo, provocando situações de
ruptura. Os municípios da Matala e Humpata têm
ainda algumas condições parculares que interessa
realçar. A acvidade agrícola geradora de excedentes
não se perdeu totalmente, existem ainda rescios de
alguma agricultura estruturada. Também a situação
geoestratégica em termos dos principais corredores
de transportes, o acesso às vias de comunicação
possibilitou algum nível de conservação das estruturas
produvas pelo que o rendimento nestas vilas é maior
do que nas restantes GPH (2009).
Segundo o GPH (2009), a população da província da
Huíla apresenta relava homogeneidade. Com efeito,
pertence, na sua maioria, à etnia dos Muílas, que
conjuntamente com os Gambos constui uma unidade
maior, os Nhanecas. Neste sendo, poder-se-á dizer
que a população huilana pertence especicamente
a seis grupos etnolinguíscos, designadamente os
Nyaneca-Nkhumbi, Umbundo, Nganguela, Quioco,
Herero e não-Bantu.
Os dados demográcos disponíveis são extremamente
escassos, embora os que serão apresentados mereçam
um grau de conança relava devido aos seguintes
factores: falta de um censo recente; divergências nos
valores dos dados nas diversas fontes consultadas;
movimentos populacionais provocados pela situação de
guerra; Os dados referentes aos anos de 1985, 1990, 1993
e 1998 são valores esmados e não valores absolutos.
Contudo, esta situação não impossibilita uma análise
demográca representava da população em estudo.
A parr da análise do presente quadro, podemos
vericar que, a população da província da Huíla tem
vindo a aumentar no decorrer dos anos. O maior
acréscimo global da população registou-se na década
de 70, cuja taxa de variação angiu 20%. Na década
seguinte este acréscimo populacional manteve-
se, mas com menor signicado, apenas 11%. Na
década de 90, o aumento populacional foi ainda
menos signicavo, situando-se, somente, na ordem
dos 5%. O baixo acréscimo populacional existente
entre 1980-90 resulta, precisamente, da situação de
guerra vivida neste país. Nestes termos, de 1970 para
2009 a população aumentou 50%, o que traduz um
crescimento populacional a um ritmo regular, sem
grandes oscilações GPH (2009).
Abordamos a nossa matéria a parr de alguns conceitos
chave, tais como: Violência políca, impactos
psíquicos, ansiedade e depressão.
A violência como objecto de estudo é algo muito geral.
Diríamos que ela, enquanto objecto material, precisa ser
delimitada pelo ponto de vista a parr do qual é estudada,
ou seja, pelo objecto formal. Obedecendo a esta
exigência da lógica, pretendo analisar, neste trabalho, a
violência nos municípios do Lubango, Humpata e Matala
do ponto de vista de sua variável políca.
Foi certamente o lósofo inglês Thomas Hobbes quem
realizou, na modernidade, a primeira sistemazação
losóca acerca da violência como caracterísca do
homem em sociedade. Hobbes (1974) considerava
que a discórdia provinha da natureza do homem,
sendo que as três causas principais da mesma
seriam a compeção, a desconança e a glória. “A
primeira – frisa o lósofo (Hobbes, 1974: 79) - leva
os homens a atacar os outros tendo em vista o lucro;
a segunda, a segurança; e a terceira, a reputação.
Os primeiros usam a violência para se tornarem
senhores das pessoas, mulheres, lhos e rebanhos dos
outros homens; os segundos, para defende-los; e os
terceiros por ninharias, como uma palavra, um sorriso,
uma diferença de opinião, e qualquer outro sinal de
desprezo, quer seja directamente dirigido às suas
pessoas, quer indirectamente aos seus parentes, seus
amigos, sua prossão e seu nome”.
A violência políca ocorre, segundo o mesmo lósofo
inglês, em dois momentos: antes do surgimento do
estado e quando este se corrompe. Hobbes (1974)
denomina de “guerra de todos contra todos” à situação
de violência social anterior à criação do estado. Nela,
a vida humana não valia nada e todos eram reféns
do temor da morte violenta. Hobbes retratava assim
essa situação, como sombrias cores que traduziriam
perfeitamente o clima de violência, impunidade e
insegurança que vivemos hoje nas nossas sociedades
africanas: tudo aquilo que é válido para um tempo
de guerra, em que todo o homem é inimigo de todo
o homem é válido também para o tempo durante o
qual os homens não têm outra segurança senão a que
lhes pode ser oferecida pela sua própria força e sua
própria invenção. Numa tal situação não há lugar para a
indústria, pois seu futuro é incerto; consequentemente
não há culvo da terra, nem uso de mercadorias
por obstrução das vias rodoviárias e ferroviárias de
comunicação, não há conhecimento da face da terra,
nem cômputo do tempo, nem artes, nem letras; não
há sociedade; e o pior de tudo, prevalece um constante
temor e perigo de morte violenta. E a vida do homem
é solitária, pobre, sórdida, embrutecida e curta”
(Hobbes, 1974: 80).
Com Deleuze e Guaari (1997), didaccamente a
violência pode ser disnguida em quatro regimes:
políca, guerra, crime e luta. A luta é enquadrada
sob o registo da “violência primiva” caracterizada
como “golpe a golpe”, é organizada por uma série
que estabelece o código reconhecido do úlmo golpe
válido, do úlmo que tenha sido trocado ao bem
que tenha sido conquistado, o que, por seu turno,
possibilita até a ritualização da violência. A guerra é
enquadrada como um regime disnto e disngue-se
da luta enquanto mera guerra primiva, porque se
trata de idencar a mobilização de uma máquina,
que implica autonomização ante um aparelho contra
o qual se está guerreando. A violência como crime
inscreve-se no regime do “fora-da-lei” a ser de algum
modo capturada/anulada pelo “direito” – posto
como algo que captura o que não lhe é de direito,
(Deleuze & Guaari, 1997:89). Por m, políca de
estado ou violência de direito é aquela que, a um
só tempo, captura e é dotada do direito de captura;
é a “violência estrutural, incorporada, que se opõe a
todas as violências directas” que leva Weber a denir
o estado como dotado do “monopólio da violência”,
monopólio que leva os autores à deteriorização do
Estado enquanto “Estado do Direito” (Deleuze &
Guaari, 1997:89).
Estas abordagens teóricas sobre violência políca leva-nos a
concluir que a violência não constui em si uma questão
de saúde pública, mas transforma-se num problema
para a área na medida em que “…afecta a saúde
individual e colectiva e exige, para sua prevenção
e tratamento, formulação de políticas específicas e
organização de práticas e de serviços peculiares ao
sector” (Minayo, 2005:29-37).
Esta violência conduz à abordagem de temácas
correlatas, tais como os impactos psíquicos, entre eles
a ansiedade e a depressão, permindo uma análise
sobre as implicações violentas da guerra para os
indivíduos e para a humanidade.
Impactos psíquicos da violência no continuum urbano e rural do Lubango
Jorge Manuel de Sousa Chaves